A Poetisa de Peroguarda – Virgínia Dias

A Poetisa de Peroguarda – Virgínia Dias

3 de Maio, 2010 2

Cante ao Menino” – tradicional do Alentejo – numa das mais belas versões: a de Virgínia Dias, de Peroguarda, Ferreira do Alentejo (no fim do cante dá uma explicação sobre a música).

Virgínia Dias nasceu a 16 de Agosto de 1935, no Alentejo. Filha de camponeses, concluiu apenas o ensino primário.

Abandonou a escola (e o sonho de ser professora) aos 11 anos, para trabalhar no campo e ajudar a família a criar os irmãos. Ao trabalho do campo e ao conhecimento da terra, cedo juntou o amor pelas palavras e pelo canto. Nas suas próprias palavras: “foi esse dia camponês que me ensinou a ser poeta”.

Conheceu Giacometti, etnomusicólogo que registou o melhor da música tradicional portuguesa e que ouviu «O Menino» e «Solidão», dois temas que haviam de o emocionar sempre que os escutava. «Quantas vezes a gente cantava e as lágrimas corriam-lhe cara abaixo», recorda-se Virginia Dias.

Serei?
Eu! O que sou eu?
Olho-me toda! A ver se me descubro.
Serei uma amálgama de tudo
De tudo o que me marcou?
Serei?
Uns pés descalços?
A fome que me erguia,
Num canto de dor, que o céu não ouvia?
Um campo de maduro trigo,
Tombando na revolta de mal repartido?
A lágrima doendo contida,
Quando de palhaço me queriam vestida?
A nuvem que dava tudo
E nada me dava.
Doce ilusão, que o vento levava?
Serei o maltês?
Serei o mendigo?
No desespero, cinza e cansaço que trago comigo?
Na solidão, grito escancarado
Que sobre mim tomba.
Serei o montado
De tanto lhe beber o grito, lhe beber a sombra?
Na saudade, lágrima, lágrima que cresce
E não dou estancada
Serei a terra molhada?
No sonho que me tira, duma vida rasa
Serei do pássaro a asa?
No inconformismo, ao que é imposto
Na ânsia de dar, ao vento o meu rosto
Subir aos cerros, descer aos barrancos
Mesmo ao mais profundo
Serei o vagabundo?
O que sou eu?
Que sou?
Nesta angústia de ser
Já nem sei se existo.
Mas se existo eu sou
Sou sim! Tudo isto!

Poema de Virgínia Maria Dias

Fontes: patrimonio89.blogspot, casadasprimas.blogspot
Comentários
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2 comments on “A Poetisa de Peroguarda – Virgínia Dias
  1. Alexandra

    Lindo poema e disponibilidade para partilhar estas memórias de tempos tão dificeis.

    4 de Maio, 2010
  2. UniPlanet

    Olá Alexandra,
    obrigado pelo comentário.
    Mais uma vez se pode ver que a vida no campo é um bom mestre para a poesia!

    5 de Maio, 2010
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