Reconhecer os Direitos da Natureza em Portugal
Está a decorrer uma petição, em Portugal, que pede o “Reconhecimento dos Direitos Intrínsecos da Natureza e de Todos os Seres Vivos na Lei Portuguesa”.
O UniPlanet falou com os membros do grupo responsável por esta petição para ficar a conhecer este projeto. |
UniPlanet (UP): Porque é importante reconhecer os direitos da Natureza?
Nos ordenamentos jurídicos dos países da Europa (e não só), apenas as entidades detentoras de direitos, isto é, pessoas e corporações ou empresas, são titulares de uma proteção jurídica plena, nomeadamente perante os Tribunais, com vista à salvaguarda dos seus direitos, em caso de ameaça, ou à reparação de violações a esses direitos. Sendo a Natureza e os seus componentes naturais tratados como recursos passíveis de apropriação (pública, privada ou cooperativa), não beneficiam da mesma tutela jurídica, nem, consequentemente, da mesma proteção. Embora existam normas de proteção ambiental e exista um Direito do Ambiente, tal acervo normativo não tem sido apto a evitar e/ou a reparar os danos ecológicos a que vimos assistindo. Ao invés, enfrentamos atualmente a maior catástrofe planetária jamais vista, conforme evidenciado pela própria ONU, a propósito da chamada “crise ambiental”. Se a Natureza fosse considerada juridicamente como sendo o organismo vivo que é, detentora também do direito à vida e à integridade, em consonância com o seu valor intrínseco, a proteção jurídica que lhe fosse conferida teria que ser consonante com essa sua qualidade de ser vivente.
O nosso sistema jurídico atual é antropocêntrico, isto é, centrado no ser humano, e assente na crença de que a Natureza existe meramente para servir as necessidades dos seres humanos…
Em contraste com um quadro jurídico holístico que considera a nossa existência neste planeta no seu contexto ecológico, que é o que se pretende com esta petição. Os ecossistemas, bem como as outras espécies teriam personalidade jurídica, tal como sucede no caso das pessoas, singulares ou coletivas, com o direito de existirem, de prosperarem, de se regenerarem e de desempenharem o seu papel na rede da vida.
Citando Linda Sheehan, do Center for Humans and Nature: “Não podemos proteger os nossos próprios direitos, sem o reconhecimento de que esses mesmos direitos dependem da salvaguarda dos direitos da Terra”.
UP: Está a decorrer uma petição, direcionada ao presidente da República, que solicita o reconhecimento do valor intrínseco da Natureza e de todos os seres vivos. Onde a podemos assinar?
A petição pode ser assinada em: http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=direitosdanatureza.
UP: Pretendem, com esta petição, que Portugal faça parte do grupo de países pioneiros que reconhecem, no seu ordenamento jurídico, os direitos intrínsecos, e não meramente utilitários da Natureza. Quais são estes países?
O Equador acolheu, no seu texto constitucional, em 2008, o Direito da Natureza, reconhecendo a Natureza como sujeito de direitos; a Bolívia; o México; mais recentemente, a Índia reconheceu os seus dois maiores rios, o Ganges e o Yamuna, como organismos vivos detentores de direitos; a Nova Zelândia também; a Colômbia conferiu direitos ao seu rio Atrato.
UP: O que mudaria em Portugal caso esses direitos fossem reconhecidos?
Mudaria todo um modo de atuar, no que respeita, nomeadamente, à tomada de decisões económicas e/ou políticas potencialmente lesivas da Natureza e/ou dos seus componentes naturais, atualmente considerados meras externalidades, sem qualquer influência no custo de produção de bens e de serviços. Consideremos esta explicação do ponto de vista estritamente económico:
Sob a lógica da economia capitalista, diversas externalidades que têm impacto negativo no ambiente não são tidas em consideração quando se trata de calcular o custo de uma ação. A consideração da Natureza, do ponto de vista jurídico, não como mero objeto passível de apropriação mas como entidade detentora de direitos, obrigará à consideração dos efeitos negativos ambientais da produção como fatores a ter conta no cálculo do custo de produção, em vez de meros subprodutos da atividade produtiva.
Ora, neste quadro, a Natureza será melhor protegida.