Mais de 40 milhões de pessoas escravizadas no mundo – 10 milhões são crianças
A escravatura não é apenas um fantasma do passado. Em 2016, houve cerca de 40,3 milhões de pessoas vítimas de escravatura moderna, das quais um quarto – ou 10 milhões – eram crianças, de acordo com as estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Fundação Walk Free.
As mulheres e as meninas são as principais vítimas: representam 71%, ou 29 milhões, de todas as vítimas de escravatura moderna, o que significa que mais de sete em cada dez pessoas escravizadas são do sexo feminino.
“O que é alarmante nestas novas estimativas é a enorme dimensão do trabalho escravo moderno, e o facto de termos 40 milhões de pessoas espalhadas pelo mundo a viver sob alguma forma de escravatura moderna é simplesmente inaceitável”, disse Fiona David, diretora executiva de investigações globais da Fundação Walk Free.
Dos 40 milhões de vítimas de escravatura moderna, 24,9 milhões de pessoas viram-se encurraladas em trabalhos forçados e 15,4 milhões em casamentos forçados. As organizações calcularam que, do total de pessoas submetidas a trabalho forçado, 16 milhões estão na economia privada, 4,8 milhões são vítimas de exploração sexual forçada e 4,1 milhões de trabalho forçado patrocinado pelo Estado, como o serviço militar obrigatório e o trabalho agrícola.
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“Quando há 24,9 milhões de pessoas a trabalhar sob ameaça ou coerção na agricultura, pesca, construção civil ou na indústria sexual e, no entanto, de acordo com as Nações Unidas, só foram denunciadas 63 000 vítimas de escravatura às autoridades no ano passado, torna-se muito evidente o abismo entre o problema e a resposta global insuficiente”, contou a investigadora ao The Guardian.
As vítimas de exploração sexual forçada, das quais 99,4% são mulheres e meninas, são mantidas, em média, mais de 23 meses nessa situação, antes de escaparem ou serem libertadas. As crianças representam mais de 20% destas vítimas.
Esta é a primeira vez que os casamentos forçados são incluídos neste tipo de relatório. “Não é clara a razão por que o casamento forçado tem sido tantas vezes negligenciado como uma forma de escravatura na recolha de dados”, comentou Fiona David. “Se temos uma situação em que alguém é vendido para se casar e assim realizar trabalho doméstico gratuito, não tendo autonomia sexual, então quando retiramos a etiqueta de casamento desta situação, muitas vezes não é senão escravatura e precisamos de esclarecer isto para que as pessoas possam vê-lo como realmente é.”
“Estimativas conservadoras”
De acordo com as novas estimativas, a escravatura moderna é mais prevalente em África (7,6 em 1000 pessoas), seguida da Ásia e do Pacífico (6,1 em 1000 pessoas).
No entanto, a OIT e a Walk Free avisam que estas podem ser “estimativas conservadoras”, devido à ausência de dados disponíveis sobre a situação nos Estados árabes e nas Américas.
Mapa: Alliance 8.7
“Acreditamos que a estimativa global de 40,3 milhões é a mais fiável até à data, embora achemos que se trata de uma estimativa conservadora, uma vez que existem milhões de pessoas às quais não tivemos acesso, em zonas de conflito ou em rotas de refugiados, e lugares onde não estávamos certos de conseguir recolher dados sólidos, como nos Estados do Golfo, onde as barreiras de acesso e linguagem nos impedem de chegar às comunidades de trabalhadores migrantes”, disse Michaëlle de Cock, investigadora da OIT.
Para a elaboração do estudo, os investigadores recorreram a um leque de dados relativos a um período de cinco anos, incluindo entrevistas realizadas a mais de 71 mil pessoas de 48 países.
“A forma como o trabalho forçado afeta toda a família fica também clara, com 18% dos homens questionados a dizerem que os seus empregadores ameaçaram diretamente as suas famílias e filhos”, conta Michaëlle de Cock.
Embora muitas das pessoas escravizadas tenham denunciado que eram vítimas de violência ou ameaças, a maioria – 50% dos 24,9 milhões – é explorada através de dívidas e do não-pagamento de salários.
Os novos valores refletem uma acentuada subida em relação às estimativas anteriores da OIT, que apontavam para a existência de 21 milhões de pessoas submetidas a trabalho forçado no mundo, um aumento que as organização atribuem à utilização de metodologias mais eficientes e à inclusão do casamento forçado nas estimativas.
Foto da capa: Reuters/Andrew Biraj