Cientista alerta para “Armagedão ecológico” após declínio de 76% nos números de insetos
Nos últimos 27 anos, os insetos voadores sofreram um declínio dramático de 76%, de acordo com um novo estudo realizado em dezenas de reservas naturais na Alemanha. Estas descobertas estão a alarmar os cientistas, uma vez que têm graves implicações para toda a vida na Terra.
Os insetos desempenham um papel crítico para o funcionamento dos ecossistemas, como polinizadores e como uma importante fonte de alimento para as aves e outros pequenos animais.
“Os insetos constituem cerca de dois terços de toda a vida na Terra [mas] houve um declínio aterrador”, disse Dave Goulson, professor da Universidade de Sussex e membro da equipa que realizou o estudo. “Parece que estamos a tornar vastas áreas de terra inóspitas para a maioria das formas de vida e estamos, atualmente, a rumar para o Armagedão ecológico. Se perdermos os insetos, então vai tudo colapsar.”
Segundo os investigadores, os resultados do presente estudo não se limitam à realidade das reservas naturais alemãs, tendo implicações para todas as paisagens dominadas pela agricultura.
As causas deste declínio ainda não são conhecidas, mas os cientistas excluíram as condições meteorológicas e as alterações na paisagem das reservas como possíveis causas. Para eles, o uso generalizado de pesticidas e a destruição de zonas de natureza selvagem serão os fatores mais prováveis.
“O facto de o número de insetos voadores estar a diminuir a um ritmo tão elevado numa área tão grande é uma descoberta alarmante”, disse Hans de Kroon, investigador da Universidade de Radboud, que liderou o estudo. “Como há ecossistemas inteiros dependentes dos insetos como comida e polinizadores, isto coloca o declínio das aves e mamíferos que se alimentam deles num novo contexto.”
Armadilha Malaise numa área protegida da Alemanha | Foto: Hallmann et al (2017)
Os investigadores utilizaram armadilhas Malaise para capturar mais de 1500 amostras de todos os insetos voadores em 63 reservas naturais alemãs. Os resultados deste trabalho revelaram um declínio de 76% nos seus números, desde 1989. A queda foi ainda mais elevada – 82% – durante o verão, quando os números de insetos atingem o seu pico.
Embora se saiba que as populações de alguns insetos, como as abelhas e as borboletas, têm vindo a diminuir, o novo estudo, publicado na revista científica Plos ONE, incluiu todos os insetos voadores, como as vespas e as moscas que raramente são estudadas, o que o torna um indicador de declínio muito mais forte.
Como as amostras foram recolhidas em áreas protegidas, as descobertas são ainda mais preocupantes. “Todas estas áreas estão protegidas e a maioria delas são reservas naturais bem geridas. Todavia, ocorreu este declínio dramático”, declarou Caspar Hallmann da Universidade de Radboud.
Joaninha | Foto: DerSilent
Também foram registadas, com detalhe, as condições meteorológicas e as mudanças na paisagem ou nas espécies de plantas nas reservas, as quais, contudo, não serviram para explicar a perda de insetos. “As condições meteorológicas podem explicar muitas das flutuações dentro das estações e entre os anos, mas não explicam a rápida tendência decrescente”, disse Martin Sorg, da Sociedade de Entomologia de Krefeld.
Para Dave Goulson, uma das possíveis explicações é que os insetos voadores morrem quando abandonam as reservas naturais. “Os terrenos agrícolas têm muito pouco para oferecer a qualquer criatura selvagem”, disse, “Mas aquilo que está mesmo a causar as suas mortes fica em aberto. Poderá ser, simplesmente, porque não existe comida para eles ou, mais especificamente, devido à exposição a pesticidas químicos, ou a uma combinação dos dois.”
Calopteryx virgo | Foto: Dieter Metz
Os cientistas defendem a necessidade de se explorar a questão em maior detalhe, argumentando que, embora a maioria dos insetos voe, talvez os que não o fazem não abandonem tão frequentemente as reservas naturais e por isso não sejam tão afetados.
Em setembro, o conselheiro científico do governo britânico, Ian Boyd, avisou que a suposição de que é seguro usarem-se pesticidas em quantidades industriais nas paisagens é falsa e que os “efeitos de se aplicarem químicos em paisagens inteiras têm sido amplamente ignorados”.
“Precisamos de fazer menos das coisas que sabemos que têm um impacto negativo, como a utilização de pesticidas e o desaparecimento das flores nas orlas dos terrenos agrícolas”, defendeu Hans de Kroon. “Também temos de nos esforçar por alargar as nossas reservas naturais e diminuir a proporção das que fazem fronteira com zonas agrícolas.”
Os insetos são importantes fontes de alimento para muitas aves | Foto: Benjamin Balazs
“Se a biomassa total dos insetos voadores está realmente a diminuir a este ritmo – cerca de 6% por ano – é extremamente preocupante”, disse Lynn Dicks, da Universidade de Ânglia Oriental.
“Os insetos cumprem funções ecológicas muito importantes, para as quais os seus números têm muita relevância. Polinizam as flores: moscas, traças e borboletas são tão importantes como as abelhas para muitas plantas floríferas, incluindo algumas culturas. Proporcionam alimento a muito animais – aves, morcegos, alguns mamíferos, peixes, répteis e anfíbios. As moscas, escaravelhos e vespas também são predadores e decompositores, controlando as pragas e limpando, de um modo geral, o lugar.”
Também se tem falado no “fenómeno do para-brisas”, no qual as pessoas se lembram de ficar com muitos mais insetos esmagados contra o vidro do para-brisas no passado. “Acho que é real”, contou Dave Goulson. “Conduzi através de França e de volta, durante este verão – mesmo quando seria de esperar que o para-brisas ficasse todo salpicado – e, literalmente, nunca tive de parar para limpar o vidro.”