“O plástico está nos nossos pulmões e no nosso sangue”: uma conversa com Matt Simon, autor de In A Poison Like No Other

“O plástico está nos nossos pulmões e no nosso sangue”: uma conversa com Matt Simon, autor de In A Poison Like No Other

15 de Maio, 2025 0

O UniPlanet falou com Matt Simon, jornalista ambiental e autor do livro In A Poison Like No Other, sobre o impacto dos microplásticos no ambiente e na saúde humana. Com base em anos de investigação e entrevistas com cientistas da área, Matt revela como estas partículas invisíveis já estão presentes no ar que respiramos, nos alimentos que consumimos e até nos nossos corpos — e o que podemos (e devemos) fazer para travar esta crise invisível.

 

UniPlanet (UP): O que despertou, inicialmente, o seu interesse pelo tema dos microplásticos e o que o levou a escrever A Poison Like No Other?

Na altura, estava a escrever para a revista Wired, cobrindo os estudos sobre microplásticos à medida que iam sendo publicados. Durante os confinamentos provocados pela Covid, tive muito tempo livre, por isso decidi escrever o livro para me manter ocupado. Queria escrever o primeiro livro sobre microplásticos dirigido ao público em geral, uma espécie de condensado da investigação mais relevante até então. Desde então, foram publicados muitos mais estudos, especialmente sobre os impactos na saúde humana.

UP: Houve algo que tenha descoberto durante a sua investigação que o tenha realmente chocado ou perturbado?

A revelação mais surpreendente para mim foi o quão poluído está o ar interior [das casas] com microplásticos — algo como seis vezes mais partículas do que o ar exterior. Talvez não seja assim tão surpreendente, tendo em conta todo o plástico que temos em casa — alcatifas, embalagens de cozinha, roupa. A parte mais perturbadora é a dificuldade de evitar inalar microplásticos e nanoplásticos.

 

microplásticos e autor do livro

 

UP: No livro, menciona que os microplásticos são mais do que um poluente físico — são um cocktail químico. Até que ponto é que este aspeto é compreendido pelo público e pelos decisores políticos?

Penso que não é bem compreendido. Isso deve-se, em parte, ao facto de a indústria do plástico ter passado décadas a convencer o público de que os seus produtos não só eram perfeitamente seguros, como também tornavam os alimentos mais seguros por evitarem o apodrecimento. Há também muito “greenwashing” em torno de “alternativas” ao plástico, como os polímeros feitos a partir de plantas, mas esses continuam a ter todos os mesmos aditivos petroquímicos do plástico convencional. Temos de ter muito cuidado para não estarmos simplesmente a substituir os plásticos tradicionais por algo igualmente tóxico, ou ainda mais.

UP: Falou com muitos cientistas que estão na linha da frente da investigação sobre microplásticos. Quais são alguns dos maiores desafios que enfrentam para sensibilizar a opinião pública ou influenciar mudanças?

O maior desafio tem sido a falta de financiamento, especialmente nos Estados Unidos. A Europa está bastante mais avançada na investigação dos impactos dos microplásticos e nanoplásticos na saúde humana. Os investigadores estão extremamente preocupados com estas partículas e sentem urgência, mas muitas vezes não têm os fundos necessários para realizar estudos rigorosos e aprofundados.

UP: Muitas pessoas sentem-se sobrecarregadas ou impotentes perante a escala da poluição por plásticos. Como é que o seu livro pode ajudar os leitores a sentirem-se informados e com poder de agir, em vez de desanimados?

Tento deixar claro no livro que a melhor coisa que podemos fazer na nossa vida pessoal é reduzir ao máximo o uso de plástico, utilizando mais vidro, cartão e metal. Mas o mais impactante que qualquer pessoa pode fazer é doar tempo ou dinheiro a organizações que trabalham para reduzir a produção de plástico. Os investigadores são unânimes em afirmar que a única forma de sair deste problema é reduzir substancialmente a produção. Isso evitará que o plástico chegue ao ambiente e, por consequência, ao nosso corpo.

UP: Qual considera ser o papel do jornalismo na mudança da perceção pública e na pressão sobre a indústria ou os decisores políticos para agirem contra a poluição por plásticos?

Senti que a minha responsabilidade ao escrever o livro era, em primeiro lugar, alertar as pessoas para o problema. Não podemos aplicar soluções sem primeiro compreendermos a dimensão do desafio. Espero que a minha escrita tenha ajudado os decisores a perceber que a crise dos plásticos não se resume apenas aos objetos grandes como garrafas e sacos, mas também às partículas minúsculas que estão a entrar nos nossos corpos.

UP: Desde que escreveu o livro, viu surgir inovações ou mudanças políticas promissoras que lhe dão esperança?

Acontece que as tecnologias mais simples são, na verdade, as mais eficazes. Filtros que se colocam nas máquinas de lavar, por exemplo, são extremamente eficazes a impedir que as microfibras das roupas cheguem ao ambiente. Também existem barcaças que ficam nas fozes dos rios a recolher macroplásticos flutuantes, como garrafas e sacos, evitando que cheguem ao mar.

UP: Se pudesse pedir às pessoas que fizessem apenas uma coisa para reduzir o impacto dos microplásticos, qual seria?

Em casa, a melhor coisa que podem fazer é aspirar todos os dias, se possível. Os microplásticos tendem a assentar no chão e depois voltam a ser lançados no ar à medida que andamos.

UP: Olhando para o futuro, planeia continuar a escrever sobre esta questão ou irá explorar outras ameaças ambientais com a mesma profundidade?

Sem dúvida. Há cerca de um ano mudei da Wired para a revista Grist, onde agora me foco em soluções climáticas. Os plásticos fazem parte disso, mas estou agora mais concentrado em formas de combater a crise climática. Na verdade, as duas questões estão bastante interligadas, dado que os plásticos são feitos a partir de combustíveis fósseis.

UP: Por fim, para quem ainda não leu A Poison Like No Other, o que espera que retirem da leitura?

Que a situação não é totalmente desesperada. Se as Nações Unidas conseguirem negociar este ano um tratado robusto sobre os plásticos, incluindo um limite para a quantidade de plástico que pode ser produzida anualmente, isso será uma grande vitória. Sem reduzir a produção, simplesmente não há outra forma de sairmos deste problema.

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