Gigantes da tecnologia e carros elétricos estão a falhar no combate ao trabalho infantil, diz Amnistia
As grandes marcas de tecnologia e de veículos elétricos continuam a não fazer o suficiente para acabar com as violações dos direitos humanos nas suas cadeias de abastecimento de cobalto, concluiu um novo relatório da Amnistia Internacional, quase dois anos após uma investigação da mesma organização ter revelado que as baterias usadas nos produtos destas empresas podiam ser associadas ao uso de trabalho infantil na República Democrática do Congo.
A Microsoft, a Lenovo, a Renault e a Huawei estão entre as empresas pior classificadas pela Amnistia. Neste grupo também se encontra a Vodafone, que a organização diz ter adotado uma abordagem “muito limitada” no que diz respeito à investigação da sua cadeia de fornecimento.
“As nossas investigações iniciais descobriram que o cobalto extraído por crianças e adultos em condições horríveis no Congo está a entrar nas cadeias de fornecimento de algumas das maiores marcas do mundo”, disse Seema Joshi, diretora de negócios e direitos humanos da Amnistia Internacional.
“Passados quase dois anos, algumas das empresas mais ricas e poderosas do mundo ainda estão a arranjar desculpas para não investigarem as suas cadeias de fornecimento. Mesmo as que estão a investigar não estão a revelar os riscos e violações dos direitos humanos que encontram. Se as empresas estão às escuras sobre de onde o seu cobalto provém, também o estão os seus clientes”, declarou.
Fotos: Amnistia Internacional
“Este é um momento decisivo para a mudança. À medida que a procura por baterias recarregáveis cresce, as empresas têm a responsabilidade de provar que não estão a lucrar com a miséria de mineiros que trabalham em condições terríveis no Congo. As soluções energéticas do futuro não devem assentar em violações dos direitos humanos”, afirmou Seema Joshi.
Mais de metade do cobalto do mundo – um componente essencial das baterias de iões de lítio – provém do Congo, onde a Amnistia revelou que existiam crianças – algumas com apenas sete anos – e adultos a extrair cobalto em túneis artesanais estreitos, correndo o risco de sofrer acidentes fatais e de contrair doenças pulmonares graves.
O cobalto extraído nestas condições faz o seu caminho até uma empresa de transformação chinesa – a Huayou Cobalt –, cujos produtos acabam nas baterias usadas nos artigos eletrónicos e automóveis elétricos das grandes marcas.
No seu novo relatório “Tempo para Recarregar”, a Amnistia avaliou as práticas das empresas ligadas à Huayou Cobalt ou com probabilidade de adquirirem cobalto do Congo, de acordo com cinco critérios que refletem as normas internacionais. A organização deu, posteriormente, uma pontuação de “nenhuma ação tomada”, “mínima”, “moderada” ou “adequada” a cada empresa. Nenhuma empresa avaliada se qualificou para a inclusão no grupo com “todas as medidas possíveis tomadas”.
Em 2017, a Apple tornou-se a primeira empresa a divulgar os nomes dos seus fornecedores de cobalto e a Amnistia nomeou-a líder no sector no que diz respeito à aquisição responsável de cobalto.
No grupo das empresas que tomaram “medidas moderadas”, a Dell e a HP mostraram sinais de progresso, tendo começado a investigar as suas ligações à Huayou Cobalt e dispondo de algumas políticas mais decididas para a deteção de riscos e violações dos direitos humanos nas suas cadeias de fornecimento.
Vinte e seis das empresas estudadas mostraram falta de transparência, não tendo divulgado detalhes sobre os seus fornecedores.
Entre os fabricantes de carros elétricos, a Renault e a Daimler (grupo que controla a Mercedes-Benz e a Smart) tiveram um desempenho particularmente mau e a BMW foi o destaque mais positivo, tendo feito alguns progressos nas suas políticas de fornecimento e práticas relativas ao cobalto. No entanto, a gigante alemã também foi acusada de falta de transparência.
Após a investigação de 2016 da Amnistia, o governo congolês criou um comité para lutar contra o trabalho infantil no sector mineiro e elaborou uma estratégia nacional nova destinada a retirar as crianças das minas artesanais até 2025. Contudo, a Amnistia considera que faltam prazos concretos, competências claramente definidas e um plano de operações para a implementação da atual estratégia.