The Free Store: a loja onde tudo é grátis e se combate o desperdício e a fome
Em Wellington, a capital da Nova Zelândia, existe uma loja onde o dinheiro não é necessário. The Free Store (“a loja gratuita”) é uma organização sem fins lucrativos, que redistribui os excedentes alimentares de padarias, cafés, empresas de catering e restaurantes locais por aqueles que deles necessitam.
Quem visita a loja pode levar refeições, saladas, sanduíches, tartes, muffins e muito mais sem precisar de pagar. Todos os dias úteis, entre as 18:00 e as 19:00, a Free Store redistribui até 1500 excedentes alimentares.
Benjamin Johnson, cofundador e diretor da Free Store, explica que a iniciativa foi buscar inspiração a um projeto de arte realizado em 2010 por Kim Paton, no qual a artista encheu uma loja com sobras de padarias e supermercados, que os visitantes podiam levar gratuitamente.
“Ouvi dizer que alguma da comida na loja provinha de cafés”, contou. “Era a comida que sobrava ao fim do dia e que ainda estava em bom estado. Imaginem se existe mais comida nos cafés e restaurantes da cidade que está apta para consumo mas que está a ser deitada fora. Podíamos fazer algo em relação a isso.”
Fila de pessoas em frente à The Free Store | Foto: The Free Store
“De um lado, havia comida que estava em perfeitas condições para ser comida e, do outro, pessoas com fome. Podíamos facilitar uma ligação entre os dois”, disse o cofundador da Free Store à YES! Magazine.
Todos os anos, um terço de toda a comida é desperdiçada no mundo. Isto é o equivalente a 1300 milhões de toneladas de alimentos. Só em Portugal, desperdiça-se um milhão de toneladas de comida por ano, 132 kg por habitante. Isto numa altura em que 800 milhões de pessoas passam fome no mundo.
Entre os clientes regulares da Free Store contam-se estudantes, desempregados, sem-abrigo, refugiados, profissionais de todos os tipos, pessoas com doenças crónicas, entres outros.
“Não há condições relativamente a quem pode vir à Free Store”, explica Benjamin. “Não há regras. Qualquer pessoa pode vir por qualquer motivo que tenha e levar com ela o que quiser.”
Atualmente, a Free Store tem 65 fornecedores – cafés, restaurantes, padarias e empresas de catering –, que doam a comida que não conseguem vender até ao final do dia.
“É bom ver a nossa comida utlizada de um modo que beneficia as pessoas”, contou Luke Crawford, gerente da Neo Café & Eatery, que doa scones, muffins e outros artigos ao projeto há mais de três anos. Antes desta parceria, os excedentes eram oferecidos aos trabalhadores do café ou descartados.
Todos os dias, os voluntários recolhem os excedentes nos fornecedores e redistribuem-nos. Um destes voluntários é Vincent Tito, que, em tempos, também era um dos clientes da loja. “Tinha dívidas. Não estava a comer como deve ser e o meu corpo estava a ficar fraco”, conta. Voltou a ganhar forças com a comida da Free Store e decidiu que queria retribuir o favor com trabalho voluntário, fazendo café para os clientes que esperam que a loja abra.
Um voluntário guarda os alimentos recebidos no interior da loja | Foto: The Free Store
A iniciativa já inspirou outras três lojas no país, todas elas desenvolvidas pelas próprias comunidades locais, que adaptam o modelo da Free Store às suas necessidades e desejos. Estas iniciativas dependem de apoios de fundações e associações, donativos e de voluntários. Também realizam eventos para angariarem fundos.
Por todo o mundo são cada vez mais os projetos que aliam a luta contra o desperdício alimentar à luta contra a fome. No Reino Unido, o projeto Foodcycle transforma os excedentes de comida em refeições gratuitas. Na Alemanha, a plataforma digital Foodsharing, permite aos utilizadores partilhar a comida que têm em casa e não vão comer. Em Portugal, o projeto Re-Food distribui a comida que os voluntários recolhem em restaurantes, cafés, cantinas, supermercados e hotéis por famílias carenciadas. Também têm sido criadas várias apps que procuram reduzir o desperdício alimentar.
O cofundador da Free Store acredita que o seu conceito pode ser reproduzido em todo o mundo. “Tudo o que é necessário é um espaço onde trabalhar, excedentes de comida, pessoas que precisem da comida e que venham buscá-la, voluntários e um grupo de pessoas empenhadas que possam mesmo fazê-lo”, disse. “Tem de haver envolvimento local. Em todas as zonas onde existe uma Free Store, tem de haver uma comunidade de pessoas fortemente enraizada.”